O respeito do povão por Congresso, Supremo, 'instituições' etc. está em zero | Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
De 2018 para 2022, o dinheiro extorquido dos pagadores de impostos para financiar as campanhas eleitorais aumentou quase três vezes
J. R. Guzzo
(Publicado no jornal O Estado de S. Paulo, em 28 de julho de 2021)
A
democracia brasileira, por conta do que estão fazendo com ela no mundo
das coisas reais, em que os fatos vão na direção exatamente contrária ao
mundo de fantasias pregado dia e noite pelos discursos, manifestos e
orações das classes esclarecidas, não está valendo quase mais nada hoje
em dia. O “quase” está aí unicamente porque, bem ou mal, o sujeito ainda
não pode ser trancado na cadeia pelo guarda da esquina, o fiscal da
prefeitura não tem o direito de expropriar o imóvel onde ele mora e
outras graças desse tipo; no resto, e principalmente na política, foi
tudo para o diabo.
O
Supremo Tribunal Federal, os meios de comunicação e o consórcio
OAB-MST-CNBB-LGBTQIA+ conduzem neste momento uma guerra termonuclear
contra “atos antidemocráticos” e outros crimes de lesa-pátria. Não lhes
ocorre, nunca, que as agressões mais viciosas contra o Estado de direito
e as liberdades estão sendo feitas, com a bênção de todos, em safadezas
cheias de desculpas virtuosas como esta do Fundão Eleitoral de 6 bi.
Uma das maneiras mais eficazes para destruir uma democracia é tirar dela
o apoio da população — uma população que se tornou hostil ou, pior
ainda, indiferente. É o que acontece hoje no Brasil, com a corrupção
deslavada, o perdão aos ladrões de porte máximo, a impunidade permanente
oferecida pelo STF e demais tribunais superiores, a vadiagem dos
políticos e tudo o mais.
O respeito do povão por Congresso, Supremo, “instituições” etc. está em zero — com viés de baixa.
Sempre que se diz algo parecido, sempre mesmo, a primeira reação é: “Exagero… Vivemos problemas normais dos regimes democráticos… A democracia tem o seu preço…” e etc. etc. etc. Sempre que se escuta essa conversa toda tenha certeza de que estão batendo a sua carteira. Almas boas podem até acreditar que a democracia é mesmo sujeita a dificuldades aqui e ali, que só podem ser combatidas com “mais democracia” e outros feitos virtuosos. Mas os vigaristas, que sempre estão em maioria absoluta nessas coisas, sabem muito bem que não é exagero nenhum. Na verdade, dão graças a Deus pela delicadeza com que são tratadas hoje em dia as safadezas praticadas por eles para encher seus próprios bolsos com a utilização sistemática do sistema democrático.
Que exagero pode haver, quando se trata de destruição da democracia, ou da destruição de democracias rigorosamente um quarto de boca como a nossa, em chamar de calamidade um “Fundão Eleitoral” como esse que inventaram aí? Da última eleição geral de 2018 — presidente, governadores, senadores e deputados — para esta agora de 2022, o dinheiro extorquido dos pagadores de impostos para financiar as campanhas eleitorais foi aumentado em quase três vezes, ou perto de 6 bilhões de reais. É duro acreditar num roubo desse tamanho; mas, aí é que está, esse roubo acaba de ser feito. Se isso não é jogar uma banana de dinamite em cima da democracia, o que é, então?
Além do crime, há as agravantes e os detalhes sórdidos; para ficar em apenas um deles, a Câmara dos Deputados, que figura como um dos Doze Apóstolos das sagradas “instituições” nacionais, impediu, com trapaças de regimento, que os deputados pudessem votar individualmente pelo “sim” ou pelo “não”. Não deu para saber, assim, quem votou em quê; foi como fornecer máscaras para os bandidos esconderem o rosto durante o assalto.